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. Kafka
1. A sua estratégia de criação de infra-estruturas para o país foi para mim um fiasco e um erro de estratégia crasso. É verdade que o país bem precisava, ainda para mais estando no extremo da Europa, mas não no ritmo que foi imposto nessa altura. As consequências foram não só a betonização de uma boa parte do país, mas a criação da espécie pato bravo, com uma espécie de economia paralela a gravitar em torno das obras públicas. Ficou-nos até hoje esta sensação de que quem constrói estradas é que está a fazer coisas, fazendo com que não nos apercebamos do valor do investimento na educação, na saúde e na igualdade social.
2. A estratégia do ponto anterior foi a privilegiada, em detrimento especial da educação e formação. O exemplo da Irlanda, tantas vezes citado em comparação ao nosso país, é que eles começaram aproximadamente do mesmo ponto que nós, mas hoje em dia estão bem melhor. Uma grande diferença: investiram fortemente em educação e formação, e hoje em dia, empresas de alta tecnologia instalam-se no seu país, usufruindo da mão-de-obra local, altamente qualificada. Em Portugal? As empresas de produção intensiva deslocam-se para os países do Sudeste Asiático ou da Europa de Leste. Sem trabalhadores especializados e qualificados, a única coisa que nos poderia distinguir seria o preço da mão-de-obra, área em que não devíamos sequer procurar competir.
3. As privatizações foram uma panaceia que ajudou a arruinar o país, com resultados ainda hoje bem palpáveis. Optar por colocar sectores estratégicos do país nas mãos de privados só privou os cidadãos de serviços de qualidade porque os empresários são, grande parte das vezes, os primeiros a omitir a cultura do serviço ao cliente e hipotecou o futuro de Portugal. Ainda hoje, nas portagens, nos postos de combustível, nos aumentos regulares das energias, comunicações e abastecimentos básicos, é visível essa marca indelével, de um país que se colocou nas mãos de administradores que pouco se preocupam com o bem-estar social.
4. A atitude de laissez faire para os gestores nada trouxe de bom ao país. A verdade é que encontraram o lucro fácil, na altura das vacas gordas, não o redistribuindo pelos trabalhadores, e foram os primeiros a não abdicar dos rendimentos quando o cinto começou a apertar. Resultado: cidadãos um pouco mais ricos (se bem que de forma algo ilusória, mercê da abertura do crédito por parte da banca) e empresários muito mais ricos. Assim se acentuou a desigualdade social, o que nos leva ao ponto seguinte.
5. A moralização fiscal não era um cavalo de batalha: afinal, os dinheiros entravam nos
cofres públicos por meio das privatizações, vendas de património (físico e não só), concessões de obras públicas, etc. Com isto, e sendo já de há longa data a protecção (no sentido de virar a cara e fingir que não se vê) aos mais ricos do ponto de vista fiscal, os mais pobres sentiram-se e continuam a sentir-se como os que pagam, enquanto outros mantêm os privilégios de sempre.
6. A formação foi vista como algo que se tinha de fazer para justificar os dinheiros trazidos da UE. Resultado: temos uma classe empresarial muito pouco flexível e extremamente limitada em termos de capacidade de gestão, e temos pessoas com 60 anos que, mal sabendo ler e escrever, foram atiradas para cursos de Condução de Reuniões no final da sua carreira, como forma de justificar os fundos europeus. Que desperdício!
7. As exportações de baixo valor acrescentado, dada a limitada capacidade de inovação por parte dos gestores, colocam-nos hoje como meros fornecedores de algumas marcas externas, mas sem poder de mercado, sem o poder de marcas portuguesas ou de uma identidade do país, que pudesse ser a nossa vantagem competitiva no mercado europeu e mundial. Por isso, corremos o risco de sermos um dos principais afectados pela globalização nos moldes em que está a decorrer (que eram previsíveis, diga-se).
8. O abandono do Alentejo, tratando-o apenas como uma espécie de obstáculo para se chegar ao Algarve, foi desesperante. Por conhecer de perto a realidade dessa região, chocou-me o desprezo com que foi tratada nessa década. E ainda hoje estão bem visíveis as marcas.
9. O estilo autoritário, até algo arrogante, com que se lidou, por exemplo, com a questão das portagens da Ponte 25 de Abril, foi totalmente descabida. Marca da personalidade de um homem rígido (e não apenas rigoroso) e pouco sensível para o desespero do povo.
As atitudes de alguma arrogância na campanha presidencial, bem como o princípio de falar mal do outro candidato, foram as razões que o fizeram perder essa batalha eleitoral.
Com o tempo, e com o regresso à vida académica, pareceu demonstrar nas suas opiniões políticas o desenvolvimento de alguma sabedoria e de alguma sensibilidade social. Espero sinceramente que assim se mantenha, quer ganhe quer perca as próximas eleições presidenciais.
Considero-o um bom economista, apesar de não partilhar muitas das suas visões, e acho que é uma pessoa honesta e trabalhadora. Porém, e principalmente do ponto de vista social, acho que a sua pouca sensibilidade não será uma mais-valia para Portugal nestes anos que se aproximam.