Quarta-feira, 17 de Janeiro de 2007
Perda
Decidi colocar aqui os contos que escrevi em tempos, talvez como forma de auto-motivação para voltar a escrever algumas coisas. Aqui vai o primeiro.
PERDA!
por Luís Romero
12/Out/2000
Mas que Perda!!!
Ganha tempo ao não pensar em nada, empata a vida em normalidades... e que Perda!
Esta poderia (e parece!) uma (mais uma!) dissertação sobre a vida, os ganhos e perdas (agora em minúscula). Ah! E já detectaram o vocábulo implícito em ‘Perda’? Pois é... mas, variemos!
A sala de Raquel era um modelo do seu estilo pessoal. Decoração simples, semi-desarrumada, cores quentes, sem grandes contrastes. Deitada no sofá, assistia ao mais recente sucesso de audiências. Em cada 3 minutos, fazia um rápido zapping de 4 fases (recusava a televisão por cabo, pois alargaria demasiado os períodos de zapping). A amorfia era-lhe reconfortante, cultivava-a como um melómano se rodeia de elementos musicais, como um heroinómano se anula totalmente – uma questão de culto.
A antropomorfia de Raquel (ena! que palavrão!!!) referia-se explicitamente ao horror pelo género masculino. O convívio social com os homens (com letra minúscula, sim!!) trazia-lhe cada vez mais motivos de repúdio. “Não, não sou fufa!!!”, diz Raquel nesta altura (isto é, diria, pois não nos está a ouvir... ssshhhhhhh...). Reger a vida por relações eventualmente amorosas? “Bah!”. Viver na procura de sentimentos de e por seres desprezíveis? Duplo “Bah!” (portanto, “Bah! Bah!”).
Raquel não pensa em absolutamente nada, por breves instantes. Regressa do torpor com um pensamento tão mundano como oco (não quer dizer o mesmo? Bem, neste caso sim.): “O que é que eu hei-de ir comer?”.
Ela é bela. Belíssima. Linda. O seu corpo ululante (gosto desta palavra, pronto!) trazia brilhos aos olhos masculinos (e femininos, por outros motivos), mas só na praia, onde se via ‘obrigada’ a mostrar mais do que desejaria. Opta claramente por se fazer pouco elegante. Só os mais atentos reparam na insinuação daquele andar – que ela não pretende nem procura, é devido à constituição física. Mal sabe ela (ou mal quer saber), quão povoadas se encontram as mentes masculinas de atributos físicos assim.
Seios rijos, erectos, com mamilos um tudo-nada-muito-pouco desproporcionados, ancas que formatam a sua sombra de pêra, pernas de sonho (sempre ocultas por calças!)... (Sim, é verdade, já a espreitei no banho... Privilégios de narrador!!!). Os olhos são lindos, castanhos de Inverno, verdes pelo Verão. Grandes. A boca é um sonho, em forma, calor e textura. Nariz com personalidade (imaginem vocês o que quero dizer).
Preza a sua independência, em especial por repugnância à companhia. Agrada-lhe o vazio. Não, amarga não é (aliás, eu diria dulcíssima!!). Não viveu desilusões grandes. A desilusão tem vindo a crescer desde os seus 13 anos. Por nada de especial. Apenas porque se sentia incomodada. Começou por afastar os personagens masculinos, e depois por arrastamento os femininos (estes últimos em dadas alturas parecem viver para os primeiros... e vice-versa... que confusão!!! que horror!!!).
Se Raquel se sente só? Talvez, já nem ela sabe. Distanciou-se da família, também – precisava do seu próprio espaço.
Pretendem procurar uma razão, um motivo aparente para a sua aversão a homens? OK, podemos tentar. Abusos sexuais em menor??? Isso é desculpa de estrela da música ou do cinema. Não, cresceu numa família normal, normal, normal (com tudo o que isso implica). Grandes desilusões amorosas na adolescência? Nem pensa nisso mais, teve 2 ou 3 namoricos, mas que foram menores que o normalmente aceite e maiores do que ela gostaria (duraram alguns dias). Traumas sexuais?? Ora aí está uma componente muito apagada nela, por opção clara (OK, bate uma de quando em vez, era isto que queriam saber, seus pervertidos?? Isso é um momento dela, nem eu a espreito nessas alturas, por respeito!). Desencanto generalizado com os outros aspectos da vida, e também por arrastamento com este? Errado outra vez! Adora o emprego que tem, boas perspectivas profissionais, assume o cinema como hobby, sorri com as histórias de amor... enfim, gosta de quem é.
E que tal se não tentarmos compreender?? Ou melhor, se perdermos a tentação de dissecar o passado, as motivações, os desejos implícitos? Abandonarmos a tendência analítica de procurar a verdadeira personalidade? Ela é assim, OK?, e mesmo assim, sou eu que digo que ela é assim, só estão a acreditar em mim porque querem (ou não estão, e nesse caso podem ler isto de pernas para o ar, pode ser que percebam melhor o que quero – ou não quero – dizer).
Mas onde é que eu pretendia chegar com esta prosápia??? Ah, sim! Raquel tem uma aversão pelos homens em geral. E Raquel é lindíssima!!!
Mas que Perda!!!